Constipação

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17/05/2017

Artigos

A constipação intestinal, também conhecida como obstipação intestinal ou prisão de ventre, acomete cerca de 20% da população mundial. É comum em mulheres e idosos.

Conforme as queixas dos pacientes, a constipação pode ser referida como fezes endurecidas, esforço excessivo no ato evacuatório, evacuações infrequentes, sensação de evacuação incompleta e até mesmo demora excessiva no toalete.

Considera-se normal a frequência de evacuação de, no mínimo, três vezes por semana.

O hábito intestinal normal envolve necessariamente: a eliminação de fezes sólidas ou pastosas, cilíndricas ou amórficas, sem muco, pus, sangue ou restos alimentares; e, evacuações três vezes por dia até três vezes por semana, sem desconforto pélvico ou abdominal e com satisfação (sensação de eliminação completa das fezes).

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Constipação implica na presença de, pelo menos, um dos sintomas abaixo:

– Fezes duras, fragmentadas, ressecadas e em pequeno volume;
– Evacuação a intervalos superiores a três vezes por semana;
– Evacuação incompleta ou insatisfatória;
– Esforço demasiado, dificuldade ou necessidade de manobras para evacuar (remoção digital das fezes ou pressão sobre o períneo ou vagina);
– Dor anorretal ou perineal para evacuar;
– Dor ou desconforto abdominal que se resolve com evacuação.

FATORES DE RISCO:

Gênero feminino, envelhecimento, depressão, sedentarismo, alimentação, baixa renda e nível educativo, medicamentos, abuso físico e sexual. Redução da ingestão de fibras (frutas e vegetais), alimentação industrializada e baixa ingesta de água. Redução das refeições (ausência do desjejum) leva a prejuízo do reflexo gastroenterocólico. Também inibido quando ocorre em momento inadequado, mediante contração voluntária do esfíncter anal externo. Negação repetitiva do reflexo é acompanhada da perda progressiva da sensibilidade retal à distensão pelas fezes, agravando ou desencadeando a constipação.

DIAGNÓSTICO CLÍNICO:

A avaliação clínica dos pacientes com constipação deve identificar sintomas de alarme e a possível causa.

A Escala Bristol presta-se a ajudar os pacientes a descrever a consistência do bolo fecal.

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Escala de Bristol (consistência das fezes).

Também deve ser verificada a presença de elementos anormais nas fezes (sangue, muco, pus);
caracterizadas as evacuações (esforço, satisfação) e os sintomas (dor, distensão ou desconforto abdominal); obtido histórico do uso de medicações, especialmente dos laxantes; avaliada condição atual, histórico médico, cirurgias, doença psiquiátrica, estilo de vida, atividade física, alimentação e ingestão de líquidos; afastadas situações de alarme: alteração no calibre das fezes, sangramento (manifesto ou oculto), anemia, emagrecimento, sintomas obstrutivos, constipação de recente instalação, pacientes maiores de 50 anos não submetidos à triagem prévia para câncer de cólon (colonoscopia).

AVALIAÇÃO CLÍNICA:

O primeiro e mais importante cuidado na avaliação do paciente constipado é excluir a presença de causas secundárias (orgânica, doenças endócrinas (p. ex., hipotireoidismo), doenças metabólicas (p. ex., diabetes melito), doença neurológica (p. ex., doença de Parkinson), medicamentosa (p. ex., analgésicos, anti-hipertensivos, neurolépticos, etc.).

Mediante anamnese, devem-se investigar cuidadosamente sinais de “alarme” ou “alerta” como emagrecimento, hemorragia, febre, anorexia e anemia, que podem nos orientar para uma causa anatômica.

Em pacientes com mais de 50 anos, ou que se tornaram constipados recentemente, sugere-se a pesquisa de sangue oculto nas fezes, bem como hemograma completo, cálcio, glicemia e função tireoidiana. Àqueles que não responderam à orientação inicial e/ou apresentam anemia ou sangue oculto nas fezes indica-se a colonoscopia.

Testes fisiológicos para avaliação da constipação crônica envolvem: manometria, teste de expulsão de balão e tempo de trânsito colônico. A defecografia é útil para descartar desordem evacuatória.

 

TRATAMENTO:

O tratamento clínico da constipação funcional envolve correção comportamental e medicamentos.

A adesão ao tratamento repousa na perfeita relação do médico com seu paciente. Para isso, faz-se necessário uma abordagem mais do indivíduo do que de seu sintoma. A constipação crônica traz com o paciente uma história de inúmeros médicos, exames complementares e medicamentos. O primeiro passo na terapêutica é entender a expectativa do paciente e saber ouvir suas demandas.

01-CORREÇÃO DE HÁBITOS

Hábito alimentar inadequado é condição muito frequente, destacando-se ingestão insuficiente de líquido e/ou de fibras, longo período entre as refeições e abolição de uma ou mais das três principais refeições diárias. Em relação aos alimentos se enfatiza para a ingestão de fibras alimentares, presentes nas hortaliças, legumes, leguminosas, cereais e frutas.

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Um ponto relevante na terapêutica da constipação intestinal é a reeducação dos hábitos de evacuação, estimulando-se a disciplina de horário e a obediência ao reflexo evacuatório. É bastante comum, especialmente entre mulheres e homens apressados, não responder ao estímulo evacuatório imediatamente, o que causa a perda progressiva desse reflexo.

Deve-se também estimular o exercício físico, em especial a natação e a deambulação.

2 – FARMACOTERAPIA

A – Laxantes formadores do bolo fecal ou agente hidrofílico
Com a ingestão suplementar de fibras naturais à base de Psyllium ou com fibras sintéticas aumenta-se o volume fecal e a consistência das fezes, estimulando-se fisiologicamente a evacuação. Seu mecanismo de ação se baseia na retenção de líquido e aumento da massa fecal. Por isso, os pacientes devem ingerir água adequadamente. Levam de um a três dias para ter efeito. Podem determinar flatulência, distensão e empachamento abdominal. Estão contraindicados na impactação fecal, megacólon ou obstrução intestinal. Devem ser evitados para idosos, dada a hipomotilidade intestinal nesse grupo etário.

As fibras sintéticas, por não serem degradadas pelas enzimas digestivas e não serem metabolizadas pelas bactérias do cólon, são eliminadas de maneira intacta e não produzem gás.
 B – Laxantes estimulantes, irritantes ou de contato (ex. Sene, cáscara sagrada, óleo de rícino e bisacodil)
Atuam mediante estímulo de neurônios, enterócitos e do músculo liso, levando à aceleração do trânsito e ao aumento de teor hídrico fecal, por alteração de absorção ou secreção. Possui efeito laxativo rápido: leva seis a oito horas para ter efeito por via oral.

Quando usados por tempo prolongado, causam taquifilaxia (rápida diminuição do efeito de um fármaco em doses consecutivas) e a destruição das terminações nervosas do cólon. Levam à melanose colônica, ao cólon catártico e a dor abdominal. Não raro, pacientes se frustram com a prolongada expectativa de efeito da automedicação e agravam o quadro com o abuso de laxativos de contato.

C – Laxante osmótico (ex. Polietilenoglicol-PEG 3350, lactulose, sais de sódio e magnésio)
Agem fluidificando as fezes por meio de substâncias osmoticamente ativas, que “roubam” água do organismo humano através da mucosa digestiva. Leva três a seis horas para atuar por via oral.
Dos salinos, o “sal amargo” é o mais antigo e menos utilizado e o leite de magnésia (hidróxido de magnésio), muito utilizado, contraindicado para renais crônicos.
Laxativos à base de açúcares não absorvíveis (lactulose,sorbitol, manitol,lactitol, polietileno glicol-PRG) são muito empregados, inicialmente para encefalopatia hepática, preparo de colonoscopia ou cirurgia, posteriormente para tratamento da constipação intestinal. Particularmente indicados para grávidas e idosos. Qualquer deles determina flatulência, cólica ou diarreia.

A experiência mundial aponta o PEG como o laxativo de eleição, pois é eficaz, isento de efeitos colaterais, tem absorção desprezível, não é metabolizado, não é calórico e nem teratogênico, podendo ser utilizado, inclusive, para a constipação da gravidez. Ao aumentar a concentração de água no cólon, o PEG lubrifica e amolece as fezes, tornando a evacuação mais confortável.

D – Laxantes amaciantes (emolientes, lubrificantes)
Esses laxativos agem facilitando o deslizamento das fezes. São substâncias oleosas que podem, em médio prazo, diminuir a absorção das vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K). O efeito ocorre em um a três dias. Seu uso básico visa evitar esforço para evacuar, como na recuperação de infarto do miocárdio ou após cirurgias. Provocam um aumento na secreção de sódio, cloro e água, podendo causar desequilíbrio hidroeletrolítico, motivo pelo qual seu uso deve ser de curta duração. Em pacientes disfágicos e idosos devem ser evitados pelo risco de broncoaspiração e pneumonia lipoídica.

E – Laxativos procinéticos

Agem aumentando o trânsito intestinal de maneira mais fisiológica. O tegaserode tem indicação bem definida na constipação da síndrome do intestino irritável;

F – Probióticos

Três possíveis mecanismos de atuação são atribuídos aos probióticos:

– modulação da microbiota intestinal (competição por sítios de adesão, competição por nutrientes e produção de compostos antimicrobianos);

– alteração do metabolismo microbiano (aumento ou diminuição da atividade enzimática)

– estímulo da imunidade do hospedeiro.

Os probióticos afetam as bactérias intestinais aumentando o número de bactérias anaeróbias benéficas e diminuindo a população de microorganismos potencialmente patogênicos; afetam o ecossistema intestinal estimulando os mecanismos imunes da mucosa e os não-imunes através de um antagonismo e concorrência com os patogênicos potenciais.

Várias pesquisas têm demonstrado a melhorar da dor a redução da distensão abdominal e da flatulência nos tratamentos com probióticos.

03-BIOFEEDBACK

Indicado nos pacientes com esforço defecatório prolongado, sensação de evacuação incompleta, fezes finas, sensação de bloqueio (estar entupido), ou falha do tratamento por constipação com fezes endurecidas.

Geralmente, apresentam diagnóstico de obstrução de saída, decorrente de distúrbios funcionais do aparato anorretal (dissinergia pélvica, hipossensibilidade), demonstrados na manometria e teste de expulsão de balão.

O biofeedback é um tipo de treinamento em que o paciente é orientado em sessões periódicas de fisioterapia a aprender a relaxar o assoalho pélvico e, dessa forma, desbloquear o livre fluxo das fezes pelo canal anal.